Revisitado


Sempre há dois lados que falam. O segundo e o primeiro. Uma consciência que grita outra que alivia. Há também o lado que avalia os dois, o terceiro.
Tirei os papéis para olhar com cuidado. Então, comecei a separar as pastas. Primeiro as de assuntos práticos que meu lado chato chamaram de sérios, era o meu primeiro lado. E que só agora mudo de nome, porque pensando bem não tem nada de sérios. Eram correspondëncias do estado, extratos bancários e currículos para se arranjar. Eu podia imaginar o änimo dos seus pés fazendo cada papel daqueles, que agora estão ali de lado. E quanto papel para se representar! “Me deixe ficar com este, o meu.” O teu silëncio deu estas palavras, hoje há o motivo maior que me deixa ouvir.
Indo para outra fila, estes papéis de papel, se chamam agora práticos e estão parados, do mesmo jeito que serviam quando estavam misturados aos poemas e postais das cidades que você viveu escrevendo.
Vejo agora como os anos passaram, e me lembro que naquela mesma época de querer se organizar é que os textos saiam facilmente numa velocidade que faltava páginas. Sem tanto voltar e apagar, não importava saber que aquela dor nada tinha de diferente da do resto do mundo. Mas, era uma dor especial, diferente de tudo. E como era bom sofrer daquele jeito. Beber daquele jeito sem ninguém por perto. Era bom gostar disso.
O terceiro lado, não é a consciência de si, pois isso inspira caldo de mitologia grega ou romana, quando bem escrita para bons aspiradores. Falo do deixar de fluir e apagar tanto. E pagar também. Como tenho dois lados mais acostumados a enxergarem cada olho com dois olhos, aceito que estou mais atento a este ofício de avaliar que só hoje pode acenar de longe e pensar em ser chamado assim, de difícil. Mas, se o que eu queria antes com isso não é o mesmo de agora, não tenho motivo para comparar aquele a este, porque metáfora não tem conjunção, ainda que tenha intenção parecida com a comparação.
E o que eu quero. A gente tem que querer mesmo alguma coisa, com a coisa que faz? Não dá pra fazer e só? Porque tem que ser feito às penas?
Meu terceiro lado, busca os mestres que admiro. Eles fazem muito a mesma coisa até que esta seja chamada de bela. E observando, a partir do meu lado calmo, sim, aceito me livrar de mim, lapidando todo o desabafo da minha alma.
Mas, tenho que dizer que o deixar fluir não é mais o mesmo, e nunca mais será, ainda que esteja escrevendo freneticamente sobre este assunto para revisitá-los em seguida. Por hora ou outra me assombra um texto jumento que prossegue com tapas, me fazendo as vezes sem sola de pé. É porque ouço muito de como se faz isso. E tive algum prazer de ver quem admiro saborear algum suco batido deste liquidificador de outro preço.
Quando olho pra tudo dali, fico pensando o que vou fazer com isso daqui. Porque o que ouvi dá lugar a uma exigência, que embora, não seja sinônimo de qualidade técnica, me causam uma sensação sem nome que tem horas que chegam a se virar para a curva do rio de uma sensibilidade calculada. E isso dá medo. O medo de não sentir que sinto. Então uso dos meus bons remédios pra me convencer que são graçolas da mente. Coloco para ouvir um grande poema de um certo poetinha ou uma canção praiera de um compositor certo. E me lembrando de alma e natureza, sinto meu sangue descendo, diferente, mas com a cor de dentro da veia. Aquela cor.
Fora a mente, tudo é ambiente. Aqui, passarinhos sem nome me chamam, e como é bom não vê-los. E vê-los, ainda que a voz de alguém pela casa trinem forte, eu as aceito e as engulo suavemente, quando vejo dois pratos prontos para mim e para ela, a outra que faz o trinado soar o seu ar. Então posso amar.
O lado que caminha com outr, o segundo, pára e diz: são momentos. Você continua o mesmo, o momento é que passou e você foi junto com ele. Mas, não quero pensar em quem está lendo, este trabalho social é comigo mesmo.
No momento daquelas aulas eu prometia a mim que não teria os resultados dos professores, os quais eles tinham neles próprios, o de se privar até de escrever um verso dono de uma palavra que você não sabe porque veio. Mas, que ao procurar significado, caíam como anéis que não precisam de dedos. Só agora, deixo um parágrafo maior, para lembrar que embolo uma coisa na outra mesmo, faço o exercício, mas tenho saudade de mim antigo.
A gente é mesmo assim. E que delicia dizer isso, sem substituir este sentido pelo o que é melhor, o de que temos que ser agora. Serei sempre hoje revisitado de passado em cada minuto que sou agora. Sempre voltando para ir. O passado serve de referência para continuar a buscar alguém que nunca serei, que nunca irá me agradar, sempre e sempre será melhor, o melhor de mim que eu nunca vou atingir. O chamado pelo título, faz o segundo lado praticar também o que sentir com a saudade do lado que não tinha nome.

Comentários

  1. "Serei sempre hoje revisitado de passado em cada minuto que sou agora. Sempre voltando para ir. O passado serve de referência para continuar a buscar alguém que nunca serei, que nunca irá me agradar, sempre e sempre será melhor, o melhor de mim que eu nunca vou atingir".

    Será que não havia um quarto eu pra dizer pra você que é impossivel entender como em meio a tantos "eu nunca"... poderia se agradar de si? somos aquilo que verbalizamos! e seremos aquilo que desejamos verbalizar! o nunca do passado remetirá diretamente no futuro, e talvez este nunca de seu personagem, seja um sim modesto de mais que se equivocou e tornou-se um nunca.
    Acredito que o passado é sempre bom por poder recordar, e não por viver novamente. Mesmo os bons momentos em qualquer uma das nossas partes, ele só é bom por ser passado, e revistado é como uma linha traçada, por ser reta é sempre unica não se consegue reproduzir igual. Não existe reprise para momentos, o passado não é uma novela que vale a pena ver de novo. Ele é uma camera escura, que registra a luz que passa ou a sombra que se esconde, depende da parte que passa arrastado ou não. Com isso concluo, revistado ou não que seu texto é muito bom, porém em fundamentos que descordo, não por ser um pouco pessimista de mais no nunca, ou um tanto quanto, otimista de mais, e no mesmo nunca, por achar bom nisso. Mas por acreditar que no sempre voltar pra ir significa viver um presente novo de um futuro diferente do que já foi futuro presente e agora é simplesmente...
    Passado
    mil beijos e parabéns

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  2. "Se me escondo é pra não ser visto, mas posso ser ouvido".

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